Mafalda


terça-feira, outubro 31, 2006


Soberania popular

Uma conseqüência, certamente positiva, durante essa campanha eleitoral foi um maior envolvimento político do eleitor. A disputa acirrada entre Lula e Alckmin levou a população a se interessar pela busca de notícias e artigos além daqueles transmitidos pela mídia televisiva e impressa. Aqueles com o voto definido procuraram meios para defender e justificar o seu candidato. Outros, em dúvida, informaram-se a fim de decidir em quem votar.De qualquer forma, o acesso à internet foi de suma importância para o processo eleitoral.
Embora ter um computador em casa conectado à rede seja ainda privilégio da classe média, a proliferação de Cybers (centros comerciais que oferecem acesso a computadores conectados à internet, mediante o pagamento de uma taxa por hora ou por minuto) nas periferias das cidades brasileiras vem permitindo também à população menos favorecida economicamente expandir suas fontes de conhecimento. Como bem observou Luiz Carlos Azenha, repórter da Globo e internauta, o fato da população mais carente não ter seguido a escolha eleitoral da classe média deveu-se, em grande parte, às informações do mundo virtual. Foi uma das raras vezes, na história política do país, que a classe mais favorecida (não só economicamente como também, supostamente, no âmbito intelectual), não conseguiu impor sua opinião perante os mais pobres.
Terminado o pleito, ouvi algumas explicações para a reeleição de Lula que são, no mínimo, injustas. Compreendo o desapontamento de quem votou em Geraldo Alckmin, mas é preciso ter cuidado para não cair no preconceito “ingênuo”. A justificativa mais proclamada é “o povo gosta de esmolas”, o que significa uma desvalorização do “Bolsa Família” e, igualmente, de quem é beneficiado por ela. Outros dizem que Lula ganhou porque as pesquisas, por mostrar a sua vitória, induziram muitos a votarem nele. Se isso fosse uma verdade absoluta, seria impossível a eleição da tucana Yeda Crusius no Rio Grande do Sul...
Porém, a meu ver, a elucidação mais convincente para a escolha do Presidente foi a liberdade adquirida pelos menos privilegiados economicamente frente à grande mídia, através do oferecimento de informações diversas pelo espaço virtual, somada à idéia defendida por Marcos Coimbra (presidente do Instituto Vox Populi de Pesquisas) de que não votar no Lula significaria admitir que um “homem do povo” não tem competência para ser Presidente.

sexta-feira, outubro 27, 2006


O nosso “Paradiso”

Sou amante do cinema e é com imensa tristeza que vejo o prédio do Cine Barretos fechado e em estado de degradação. Acredito que a maioria dos barretenses compartilha deste sentimento e anseiam pela sua reabertura.
O Cine Barretos foi inaugurado na metade da década de quarenta com a exibição do drama Amar foi minha Ruína, com a atriz Gene Tierney. No fim dos anos 80 (aproximadamente) foi fechado: posso estar enganada, mas me falaram na época que a causa foi a falta de público! Lembro-me de ter que ir à Bebedouro para assistir a um filme. Certa vez, meu colégio organizou uma excursão até lá para vermos Questão de Honra. Era doloroso não ter um cinema na cidade (não havia as salas do Grêmio ainda).
Mas em 1993 (ou 1994) o Cine Barretos reabriu. Meu pai me levou até lá. A escolha do filme de reestréia não poderia ser melhor: Cinema Paradiso de Giuseppe Tornatore. Jamais esquecerei deste dia! Quem já viu este filme, independente de quando e onde, compreenderá meu entusiasmo. Pois esta obra retrata, com uma poesia única, a importância e a beleza do cinema ao contar a preciosa amizade entre um senhor e um garoto em uma pequena cidade italiana e seus esforços para manter o “Cinema Paradiso” aberto.
Recordo-me que nesta época teve uma promoção da Fanta no Cine Barretos: além de podermos assistir ao desenho Aladim de graça, ganhávamos refrigerantes. Eu, minha irmã e uma grande amiga fomos várias ver esta projeção. Era só diversão! Desconheço o tempo exato que cinema ficou em atividade...Um ano. Dois talvez...O que me lembro bem é que na minha adolescência não havia mais Cine Barretos. Mais uma vez fechado!
Atualmente, temos o cinema do shopping. Porém, creio que concordarão comigo: não dá para comparar aquelas salas com a magnitude do edifício central! A estrutura do Cine Barretos permite a projeção do espírito genuíno do cinema: a vivência coletiva, por um certo tempo, de um mundo ficcional, onde o público compartilha êxtase, alegria, medo ou tristeza. Além do mais, o Cine Barretos é patrimônio cultural da cidade e faz parte da história pessoal de todo o barretense que teve o privilégio de freqüentá-lo.
Que as autoridades competentes não se disponham apenas a restaurar o prédio, como também o façam no intuito de reabri-lo como Cine Barretos!

segunda-feira, outubro 23, 2006

Somos um só país
Neste último fim de semana, num bar situado no Leblon (bairro tradicional da classe média carioca), ocorreu uma briga animalesca entre lulistas e alkcmistas. Antes de prosseguir declaro que narrarei resumidamente os fatos e omitirei propositalmente a identidade partidária das protagonistas, pois assim não darei espaço para nenhuma interpretação enviesada a favor de um dos candidatos. Voltemos à fatídica noite: o desentendimento entre os grupos se iniciou com provocações verbais de ambos os lados e culminou com o confronto físico entre duas mulheres de quase quarenta anos: uma delas, após levar tapas e unhadas, reagiu mordendo o dedo da outra, arrancando-o! A moça foi levada ao hospital, mas não foi possível reimplantar o dedo... O médico declarou que este foi o primeiro caso que ele atendeu de paciente com parte do osso retirado pela mordida de uma pessoa.
Este acontecimento surpreende pela selvageria extrema, mas não é um caso isolado de agressão envolvendo paixões partidárias. No Paraíba, uma mulher foi agredida ao passar perto do comício de um dos candidatos a governador com adesivos do opositor no seu carro. Eu mesma fui atacada, mais de uma vez, com ofensas pejorativas na minha página do ORKUT (site de relacionamentos) por declarar meu apoio a um dos candidatos à presidência.
Eu era criança nas eleições de 1989, mas li muitas declarações de que a disputa eleitoral atual, no que diz respeito à postura dos eleitores, assemelha-se àquela de dezessete anos atrás. Há quem diga que agora está pior...Particularmente, sinto uma tensão no ar quando encontro conhecidos que votarão no candidato diferente do meu e, embora, na maioria dessas situações o respeito prevaleça, já notei uma certa hostilidade. É difícil apontar os culpados por este clima afrontoso. Poder-se-ia dizer que é a mídia ou os próprios candidatos... Somos sempre tentados a achar uma explicação externa a nós para justificar nossas intempéries. No entanto, deveríamos aproveitar estes momentos conflituosos para refletirmos sobre nós mesmos, nossos valores e nossa ética. Pois, independente do resultado do pleito, conviveremos com quem votou no outro candidato. E acredito que, seja qual for o eleito, desejamos perpetuar nossas amizades e, principalmente, construir um país mais justo.

terça-feira, outubro 17, 2006

Cultivem o espírito!

Há uma semana, no Campeonato Paulista, o Corinthians enfrentou o Santos. O jogo não foi transmitido pela TV aberta, apenas através do pay-per-view . Um torcedor santista, conhecido meu, foi assistir num bar, na companhia de amigos, santistas, são-paulinos e corinthianos. Ainda no primeiro tempo, o Santos abriu o placar e este santista cantou o hino do seu clube. Um dos amigos corinthianos revoltou-se e lhe deu um murro no queixo! Ao saber do acontecido fiquei perplexa: o torcedor foi agredido por um amigo com quem convive diariamente por causa de uma partida de futebol! O detalhe curioso é que o grupo que se reuniu para ver a partida era composto de estudantes de uma das mais conceituadas universidades públicas do país. Educação acadêmica é o que não falta para o rapaz ofensor...
Casos de agressão envolvendo estudantes de nível superior não é novidade. O fato contado abranda-se se lembrarmos do calouro de medicina morto numa universidade anos atrás...De qualquer forma, embora não tão grave, a briga entre os amigos demonstra mais uma vez que diploma não garante, necessariamente, a formação de um indivíduo que respeite o outro.
Hoje em dia, o convívio entre pais e filhos é reduzido e a escola tem um papel crucial no preparo da criança para a vida. No entanto, a Educação brasileira, desde a infantil até o ensino-médio, parece falhar na sua função. As escolas particulares cumprem com eficiência o conteúdo acadêmico, mas deixam a desejar na formação humanista dos alunos. Já nas escolas públicas, devido às condições adversas, o prejuízo é sentido em ambos aspectos.
Não é durante a universidade que se dá o desenvolvimento psico-social do ser humano. É na infância e na adolescência. Atrocidades cometidas por um estudante do nível superior refletem uma educação mal empreendida nos anos escolares. É certo que os pais desempenham um papel fundamental na formação da índole dos filhos, mas a escola, potencialmente, tem o poder de aperfeiçoá-la e, se preciso for, corrigi-la. Quando a Educação assumir este compromisso e concretizá-lo, teremos um maior número daquele tipo de profissional que se destaca não só pelo desempenho no ofício, como também por uma atitude íntegra nas relações com o outro, seja este um familiar, um amigo ou um desconhecido.

sexta-feira, outubro 06, 2006



Devaneio (?)

Eu tive um sonho. Estava num país de dimensões gigantescas... E eu o apreciava lá de cima, pois eu estava voando! Sob essa perspectiva eu via uma imensidão verde com pinceladas de azul. Quanto mais eu me aproximava, seus contornos se definiam. Pensei se tratar de uma obra de Monet. Fui tragada por essa beleza e decidi pousar. Foi difícil decidir onde: tudo naquele lugar era deveras estonteante!
Resolvi seguir a intensidade do verde e fui para o norte. Nunca havia visto floresta tão rica, com árvores altas e imponentes. Aos poucos fui deslumbrando-me com os animais: macacos, antas, garças... Cheguei nas margens do rio e encontrei peixes-boi, ariranha, lontra, tartaruga...Nossa, a diversidade da fauna e da flora era tamanha que eu não saberia descrevê-la! O estranho foi que após muito caminhar, não vi nenhum sinal de vida humana. Sobrevoei a área: não havia casas, pastos... nada!
Segui em direção ao nordeste. Deparei-me com um chão árido. Mas isso não tornava a região feia. Sobre a minha cabeça, passou uma formosa ararinha-azul. Atravessei a área em meio a juazeiros e jatobás, veados e gatos selvagens. Topei uma serra e a sobrevoei. Para minha surpresa, após ver à distância uma mata densa, contemplei uma imensidão de areia e, avante, o mar. Parecia o paraíso!
Continuei minha aventura. Fui para o centro do país. Avistei matas e rios, e também muitos animais, como o temível jacaré e a exuberante onça-pintada. Depois, chapadas e cachoeiras. Nas margens de um enorme rio (chegava até o nordeste semi-árido), havia lobo-guará e gavião. Seguindo em direção ao litoral sudeste, vi uma vasta floresta. Pude constatar que ela se estendia do sul até o nordeste do país. Pousei e logo notei os micos-leões-dourados e os tamanduás. E incontáveis espécies de flores, como as orquídeas. Fui para o sul, pelo seu interior, e encontrei as araucárias e, mais adiante, uma vasta planície verde.
Terminada a viagem, percebi que aquele lugar se assemelhava ao que um dia fora meu país. No entanto, não havia homens, mulheres ou crianças em parte alguma. Dei-me a chorar desesperadamente! Então escutei uma voz: “Vocês se extinguiram! E assim, conseguimos renascer!”. Espantada, perguntei: “Quem é você?”. A voz respondeu solenemente: “Sou a natureza!”.