Mafalda


sexta-feira, setembro 21, 2007


Memórias de um pedaço de pano

Sou uma camiseta, mas não uma qualquer: tenho 14 anos e trago em mim o retrato de um famoso líder de banda de rock. Estou velha. Minhas condições são realmente precárias: parece até que participei de uma grande batalha! A verdade é que fui muito usada desde que fui escolhida na Rodoviária de Ribeirão Preto.
Minha dona me ganhou quando estava com a idade que tenho hoje. Ela era fã dos Guns N’Roses e, especialmente, do vocalista, Axl Rose. Mas ao procurar, nesta cidade, por uma camiseta estampada com seu ídolo, ela não encontrou. Para a alegria dela, sua tia achou-me e, coincidentemente, a minha estampa era a mesma do seu pôster preferido.
A primeira vez que ela me usou foi uma ocasião especial: não havia cinema aqui e a sua escola organizou uma excursão até o shopping de Bebedouro para que os alunos assistissem “Questão de Honra”. Ela me vestiu com orgulho (naquele tempo, início da década de 90, não se usava “blusinhas” ou baby-looks), completando o traje com uma bermuda jeans e tênis. Neste dia, senti-me parte de sua identidade!
Lembro-me também que minha dona adorava me colocar para ir às aulas de teclado. E, depois que inaugurou o shopping de Barretos, foi comigo muitas vezes lá. Apareço também em várias fotos: em algumas, além de mim, ela está com um lenço amarrado na cabeça, tal como Axl Rose costumava fazer. Sua amiga e sua irmã a acompanhava na “fantasia”. Mas poucas vezes saíram em público assim, pois minha dona, apesar de gostar de usar o lenço, ficava envergonhada (vivendo entre elas, notei que o comportamento de uma influenciava o das outras. Deve ser porque estavam na tal da adolescência...).
Aos poucos fui sendo deixada de lado. Meninas não mais vestiam camisetas. Porém, minha dona não me descartou completamente. Guardou-me no armário junto com outras camisetas, como a da Copa de 94 e as da Copa de 90 e 86(!). Alguns anos atrás, ela resolveu adotar-me como pijama. Não era o que eu esperava, mas foi melhor do que ficar inútil...Quando ela começou a usar suas camisetas para praticar esporte, infelizmente eu já não estava em condições para isso. Tornei-me um farrapo. No entanto, ela ainda dorme comigo, mesmo com seus familiares insistindo para jogar-me no lixo. Presumo que ela não o faz porque, ao lhe trazer boas lembranças, induzo-a a bons sonhos.

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