Mafalda


quinta-feira, fevereiro 28, 2008

Antes que eu desista

Assisti inúmeras vezes ao filme “Perfume de Mulher”. Não me canso. Além da estonteante atuação de Al Pacino (dá uma imensa vontade de dançar um tango com ele) acompanhada pela atuação também marcante de Chris O’Donnell, a história me comove ao tratar do tema integridade. O que significa ser íntegro? Significa ser justo, incorruptível, honesto, imparcial. Olhando para o mundo hoje, parece-me raro encontrar indivíduos qualificados como tal.
Em Brasília, no Planalto Central, por exemplo, se houvesse uma medida intitulada “densidade de integridade” (por analogia à densidade demográfica) seria baixíssima. Mas não podemos esquecer que os políticos são eleitos por nós... E desta forma, cabe aqui a seguinte provocação: até que ponto eles representam nossos interesses? Não serão eles reflexo de toda a sociedade?
Ser íntegro não é uma tarefa simples. Vivemos num país onde trapacear para se dar bem não é uma atitude necessariamente condenável - a retidão moral não é incentivada na nossa cultura. E se deixarmos a hipocrisia de lado, perceberemos que muitas vezes aprovamos a esperteza (no sentido pejorativo do termo) alheia: não é à toa que novelas e Big Brother (lembram do Alemão?) dão tanta audiência...E mais, se olharmos para nosso próprio umbigo, quantos de nós poderá afirmar com convicção que está ileso totalmente de ter cometido uma atitude injusta? Quantos ao eleger um prefeito ou vereador não o fazem em defesa de interesses pessoais? E quantos filhos não reproduzem a as atitudes desonestas dos pais que os ensinam que status e riqueza são o que realmente importa? É doloroso sentir que para sobreviver e ser valorizado socialmente talvez seja mesmo necessário não ser radicalmente íntegro...
Mas quando eu assisto ao “Perfume de Mulher” eu me encho de esperança. Esperança com relação a mim mesma traduzida numa vontade de buscar sempre o caminho da integridade. Tropeços todos nós cometemos e crescer como pessoa é um realizar constante. Basta não desistir, basta não ceder aos benefícios imediatos. Por tudo isso não esqueço a frase proferida com fervor pelo personagem de Al Pacino (tenente-coronel Slade): “não há nada pior que um espírito amputado, não há prótese para isso!”

quinta-feira, fevereiro 21, 2008


O sonho

Vou contar uma história, uma história sobre um sonho que jamais irei me esquecer. Vamos a ele.
Eu estava chateada com minha vida, achava que faltava brilho, emoção, paixão. De repente, andando pela rua esbarrei-me em algo que não sabia definir se era uma pessoa ou um anjo, mas quando olhei para trás, ele já não estava lá. Assustei mas continuei andando. Sem rumo. E de súbito o “anjo-pessoa” apareceu na minha frente. Olhou-me fixamente. Parecia desvendar minha alma, descobrir meus desejos e me conhecer desde sempre. Percebi que ele era o meu verdadeiro amor! Não tinha como não ser. Eu sentia! Ele nem precisou dizer nada para eu saber. Foi instantâneo! E quando ele falou, ele não falou: ele recitou poesias, as mais doces palavras que eu ouvira até então! Ficamos extasiados! E sem pedir, ele me roubou um beijo. Eu estava próxima ao céu. Foi o beijo mais terno que recebi!
Fizemos muitas promessas, juramos que nunca nos separaríamos. Mas havia um único problema. Ele era um anjo. E como anjo teria que ir embora. Fiquei aflita. Perguntei a ele se não haveria uma forma dele se tornar humano. Ele disse que sim, mas levaria tempo. Ele tinha muitas missões ainda para cumprir e só depois poderia pedir a Deus para torná-lo uma pessoa real. Eu disse que esperaria o tempo que precisasse, pois jamais havia sentido um amor assim. E ele disse que apareceria quando pudesse, pois era impossível ficar tempo demais assim afastado. Ele me visitaria às vezes.
Ele se foi. Fiquei com saudade, mas não me aborreci. Tinha ele no meu coração. Quando nos reencontramos senti que todo seu amor ainda estava ali. Mas com o tempo, eu comecei a sentir angústia. Sentia que ia perdê-lo a qualquer momento. Ele continuou a me visitar, mas vivia preocupado com suas obrigações e não era mais tão afetuoso como antes. Eu perguntava o que estava acontecendo, ele me dizia que nada havia mudado. Porém meu coração não ficava tranqüilo, passei a sofrer.
Então, finalmente, percebi que eu havia acordado há tempos, que meu sonho se acabara na primeira vez que meu anjo se foi. Eu não conseguia suportar a não possibilidade de um amor assim. Eu não queria acreditar que anjos querem voar!

quinta-feira, fevereiro 14, 2008


Existo, logo mudo!

A cada dia que vivo, vejo que tenho muito a aprender. Surpreendo-me, pois, embora eu nunca tenha deixado se considerar a vida um constante aprendizado, havia aspectos do meu ser que eu julgava não necessitar de mais transformações. Era apenas ilusão: percebi que tenho a tendência de fugir quando a situação exige-me mudar. E com isso notei como é fácil desistir de um objetivo e culpar as circunstâncias por isso. É cômodo e menos doloroso.
Ninguém, gozando de plena sanidade mental, deseja intencionalmente sofrer. E assim recusamos aquilo que nos traz sofrimento. É uma reação natural. No entanto, toda transformação relevante demanda o questionamento de nossas atitudes e valores. E é inevitável que isto traga alguma forma de tormento. E muitas vezes recuamos diante da possibilidade de sofrer, pois quando aspiramos ao bem-estar imediato, o medo cega-nos quanto aos benefícios posteriores.
O curioso, na minha vida, é que o fato de eu ter enfrentado problemas parecidos no passado, deu-me a sensação que eu havia mudado. Mudanças aconteceram sim, mas não profundamente como eu pensara... O ideal seria que toda situação adversa que passamos, tornasse-nos mais habilidosos para resolver questões futuras. Não é o que acontece sempre. Muitas vezes um acontecimento atordoante, ainda que superado, deixa-nos receosos ou arredios, o que nos impede de ver que a situação é apenas aparentemente semelhante. E assim, tornar-se mais fácil desistir antes de tentar.
Enquanto eu escrevo, penso que talvez algo em mim realmente tenha se transformado. Pois hoje, diferentemente de outrora, não só percebo minhas falhas: aceito que preciso mudar. Eu desejo me aperfeiçoar como ser humano. Aprender com o passado em vez de usá-lo como barreira dos meus sonhos. Posso sofrer no início, mas sei que a cada pequena conquista me sentirei mais senhora do meu próprio destino.
Enxergar as amarras do passado e vislumbrar um agir independente dele, penso ser um dos primeiros passos para a conquista da genuína liberdade.

quinta-feira, fevereiro 07, 2008


Nós e os outros

Em cidades do interior como Barretos vestir-se de forma distinta da maioria é ousadia de poucos. Aqui as pessoas sentem-se mais à vontade quando estão parecidas com as outras, trajando o que está na moda. Já em cidades como São Paulo, ser diferente é a maneira que muitos procuram para se destacar na multidão.
Em São Paulo, somos apenas mais um. Nas ruas, no metrô, nos ônibus, não importa de quem você é filho e nem seu sobrenome. Se por um lado ser um anônimo provoca um certo desamparo, por outro a liberdade perante o olhar do outro é maior: o paulistano está acostumado a ver de tudo...Mas estive na capital no carnaval e, ao observar, sobretudo, os jovens, veio-me a indagação: até que ponto são livres?
De fato, em São Paulo, as pessoas se vestem de maneira bastante diversificada. Entre os jovens, há os góticos, os clubbers, os hippies, os metaleiros etc. No entanto, ao mesmo tempo em que demonstram ser livres para expressar suas preferências, diferenciam-se cada vez mais em busca do olhar do outro. Ou seja, a condição de ser mais um na multidão gera, concomitantemente, a liberdade diante do outro e o desejo de ser notado pelo outro.
É curioso notar que o julgamento do outro é determinante tanto numa cidade como Barretos quanto em São Paulo. No entanto, o efeito é inverso: aqui buscamos uma aparência semelhante. Já os paulistanos são levados a se diferenciar. Aqui sentimos falta de liberdade devido à censura do outro. Em São Paulo, o excesso de liberdade gera, ironicamente, o sentir-se aprisionado pela necessidade de se destacar a fim de obter a atenção do outro.
Ainda que alguns afirmem categoricamente não se importar com quê os outros pensam, acredito que é praticamente impossível se desvencilhar completamente do julgamento alheio. Ainda que para os mais jovens o olhar do outro seja mais determinante, na maturidade continuamos dependentes dele. Mesmo aquele que busca o total isolamento, espera do outro o reconhecimento de seu ato. É da natureza humana, pois somos “o intervalo entre o nosso desejo e aquilo que o desejo dos outros fizeram de nós” (Alberto Caeiro).