Mafalda


quarta-feira, janeiro 30, 2008

Pensamento livre (?)

Ter opiniões e valores (éticos, morais e religiosos) é uma necessidade natural do ser humano. Integra o processo de constituição de sua personalidade. No entanto, quando as convicções são tomadas como verdade absoluta, o radicalismo toma o lugar da ponderação.
Recentemente li um artigo (de quem não me lembro o nome), na Folha de S. Paulo, que criticava a postura de acadêmicos europeus frente à visita do Papa Bento XVI à Universidade de Roma, da qual são docentes. Os doutores, sob alegação de que o Papa é o “artesão” do atraso cultural e contrário ao pensamento livre, vetaram a sua presença e conseqüente palestra que seria proferida por ele... Se Bento XVI vem se mostrando demasiadamente conservador, os detentores da ciência foram ainda mais radicais, pois qualquer universidade é um espaço para o debate de idéias e contínua construção do saber: rechaçar este processo significa macular seu espírito.

O fanatismo nunca gerou bons frutos: fascismo, nazismo, apartheid... O século passado está manchado devido às atrocidades em nome de verdades consideradas inquestionáveis por aqueles que as defendiam. Mas sabe-se bem que tais absurdos não se restringem ao século XX: barbaridades cometidas na tentativa de impor uma crença (religiosa, política e/ou étnica), foram comuns na história de nossa civilização (por exemplo, a Guerra Santa e a Inquisição).

Diante de tantos modelos negativos, não seria esperado que condutas radicais fossem cada vez mais incomuns? Infelizmente não é o que se vê: ainda que a postura dos acadêmicos romanos não tenha provocado nenhuma catástrofe, é preocupante, pois de pessoas com mais conhecimento espera-se atitudes mais sensatas. No entanto, não precisamos ir longe para enxergamos as conseqüências realmente nefastas do fanatismo: assassinatos cometidos por torcedores de clubes futebolísticos e espancamentos e mortes provocadas por jovens neonazistas são acontecimentos freqüentes no nosso país.

Dizem que a certeza é irmã da loucura. O curioso é que apreciamos mais as certezas do que as dúvidas. A certeza nos dá segurança. A dúvida nos atormenta. Mas defronte de tantos absurdos, prefiro nada afirmar...

quinta-feira, janeiro 24, 2008


Nos olhos de quem vê

Dias atrás, assisti pela primeira vez a um programa no canal Futura chamado “Não é o que parece”. Cada semana o programa aborda um tema e nesta ocasião o assunto era “Beleza”. De forma bastante dinâmica e recheada de depoimentos, tanto de pessoas comuns quanto de especialistas, foi discutido se o que é considerado belo depende do julgamento de cada pessoa ou se existe realmente um modelo de beleza universal.
Entre tantos depoimentos, o de uma garota de apenas 11 anos chamou bastante a minha atenção. Ela mostrou seu trabalho de escola que, através de ilustrações feitas por ela mesma, mostrava que o padrão “Barbie” é uma ilusão. Enquanto exibia seus desenhos, ela dizia que ninguém jamais será como a Barbie e que fantasiar é necessário, mas que não se deve esquecer a realidade. Outra colocação que achei bastante relevante foi a de uma psicóloga. Segundo ela, o padrão de beleza feminina atual é o da top model Gisele Bündchen e poucas pessoas conseguem atingi-lo. Ela enfatiza que é preciso modificar este padrão, pois não alcançá-lo tem gerado muito sofrimento: um padrão de beleza deveria abranger a maioria e não uma minoria.
Quem determina um padrão de beleza? Na Renascença, o exemplo de beleza era totalmente diferente. De forma bastante humorada, o programa mostrou que as mulheres retratadas naquela época teriam que fazer inúmeras “lipos” e os mais diversos tratamentos para se enquadrarem no padrão atual. Mas não é preciso voltar tanto tempo assim: em vinte anos, o modelo de beleza se modificou bastante. É difícil dizer se é a maioria que, de forma espontânea, elege um padrão, ou seja, se há um consenso e por isto este padrão se sobressai ou se este padrão é imposto pela mídia, incessantemente, de maneira a se tornar temporariamente universal. É mais provável que seja uma via de mão dupla: a mídia apresenta a “bola da vez” e testa a adesão do grande público. Quando a maioria aprova, surge um novo modelo.
Mas ainda que apreciemos as beldades da televisão, do cinema e das passarelas, nossas escolhas pessoais, na maioria das vezes, não obedecem a estes critérios: o que nós achamos belo é subjetivo e, no mundo real, a beleza interior é deveras importante!

quinta-feira, janeiro 17, 2008

Petrificando

Às vezes é penoso me sensibilizar com o que acontece ao me redor. Eu já não assisto TV para não ficar sobrecarregada (não que a TV me afete tanto, mas fico imaginando milhões de crianças assistindo a novela das “oito” e, agora, o Big Brother...). No entanto, vejo preconceito, intolerância e egoísmo no dia-dia. Basta acordar.
Não sou o tipo de pessoa que costuma discutir ao presenciar uma injustiça. Já fui assim e percebi que não vale a pena: algumas pessoas consideram as próprias verdades absolutas e indagá-las é como socar uma parede de concreto... Além disso, questionar o que já é um hábito pode te tornar mal quisto no grupo. Mas não posso tapar meus ouvidos. Escuto disparates que, mesmo não sendo dirigidos a mim, doem. Sartre, um filósofo francês, dizia que ao escolher o tipo de ser humano que você deseja ser, você escolhe a humanidade a qual pertencerá. Deve ser por esta razão que me choco: não é esta a humanidade que escolhi.
Tenho estado serena. Afinal, para que me incomodar enquanto quase ninguém se importa? O ofendido reage como o ofensor. Olho por olho, dente por dente. Porém, se observo atentamente, vejo que o ofendido não tem outra opção: ele cresceu ouvindo exatamente as mesmas asneiras. Devolvê-las à altura foi a forma de se defender aprendida por ele. É compreensível. Mas percebo que quando o ofendido encontra alguém que, por outra particularidade, pode ser mais destratado que ele, ele age como seus ofensores, ainda que este outro alguém não tenha lhe ofendido. E todos aprovam, todos riem. E eu ameaço um sorriso a contragosto. Eu não falo mais. Penso e sinto.
Pode ser apenas brincadeira. Posso estar exagerando. Mas ao me colocar no lugar do ofendido, sinto dor. O que me preocupa é que este desconforto tem passado cada vez mais rápido. Sinto-me pressionada a fazer parte da “diversão”. Confesso que às vezes tento, mas, para mim, é inadmissível brincar pejorativamente com alguém sabendo que no fundo aquilo lhe causa sofrimento. Não sou santa, já fiz algo do tipo e me arrependi.
Temo perder meu coração. Temo que esta humanidade me escolha.

quinta-feira, janeiro 10, 2008


Relação a dois

Ontem eu estava conversando com um amigo através da internet e ele estava se perguntando se o maior problema dos seres humanos são os relacionamentos amorosos.. Idealmente, um relacionamento amoroso nos deveria trazer, sobretudo, contentamento, mas nem tudo são flores.
Às vezes esperamos encontrar a pessoa dos nossos sonhos. Como num passe de mágica, aparece alguém que preenche todos os nossos requisitos. Projetamos nela tudo que desejamos, vemos nela a perfeição. Todos que se apaixonam passam por isso. Com o tempo, a pessoa verdadeira vai aparecendo. Isto pode levar semanas ou anos. Mas um dia não estaremos mais diante de um ideal e sim de alguém de carne e osso. E talvez seja esta a grande encruzilhada dos relacionamentos. Refletimos: amo esta pessoa que está à minha frente, esta pessoa que carrega uma história? Ter esta pessoa ao meu lado significa não mais contemplá-la, é preciso acolher suas fraquezas, é preciso tirá-la do pedestal! Estou disposto a amar?
Muitos casais se acertam, pois muitos vivem juntos por anos. Dividir alegrias, angústias e fazer renúncias aprende-se a dois e pequenos conflitos são inevitáveis. Mas a grande assombração da maioria dos relacionamentos é a infidelidade. Pode ser que há casos que uma traição se justifique, mas depois de feito não importa mais. A questão é: é possível perdoar uma traição? Bom, alguém falaria: depende. Particularmente, eu penso que se a traição não alterar o relacionamento, se a pessoa enganada conseguir aceitar a outra de volta, sem guardar rancor e tendo a confiança que isto não se repetirá, é possível perdoar (mas talvez isto não passe de uma idealização minha, talvez a relação jamais volte a ser a mesma...).
No entanto, existem outras formas de deslealdade. Podemos ser desleal quando dizemos o que não sentimos. Às vezes achamos que sentimos, às vezes não temos certeza mesmo, mas é preferível não dizer caso tenhamos dúvida. A palavra tem um poder imensurável e pode modificar a vida de quem a escuta... Não sei dizer se os relacionamentos amorosos são o nosso maior problema, mas acredito que amar e se permitir ser amado é uma dádiva que não deveríamos menosprezar.

domingo, janeiro 06, 2008


Em família

Cada um vive à sua maneira, mas temos necessidades em comum. Precisamos de uma referência para viver, assim precisamos amar um outro. Precisamos realizar algo que dê sentido à nossa existência, assim precisamos de um sonho. Precisamos trabalhar, precisamos ter amigos... Precisamos, sobretudo, de nossa família!
Outro dia recebi um e-mail que falava sobre o significado da palavra família. Não sei ao certo a veracidade desta informação, mas vale a pena registrar aqui. Família vem do inglês Family, onde cada letra, supostamente, é a abreviação de uma palavra: Father (pai) And(e) Mother(mãe) I (eu) Love (amo) You (vocês)....Este o núcleo familiar. É nossa base. E amor é o que esperamos encontrar entre pais e filhos: não há nada mais lamentável do que uma família onde não há amor.
Mas entendemos como família não apenas os pais: há os avós, irmãos, primos, tios etc. Minha família é bastante numerosa (eu não saberia dizer quantos parentes tenho atualmente e muito menos afirmar conhecer todos eles). Este ano escolhi passar o reveillon na casa de minha madrinha. Nunca tinha ido lá nesta ocasião. Fiquei longe de meus pais, irmãos e sobrinhos, mas em compensação encontrei pessoas que há muito tempo não via: tios-avós e primos de segundo e terceiro graus. E o mais importante: fiz amizade com primas que antes eram apenas parentes praticamente desconhecidos. Não fizemos nada de extraordinário: na noite da virada cantamos no videokê - até quem era contra ligá-lo durante a festa, rendeu-se à cantoria. Foi divertidíssimo: três gerações presentes e todos soltando a voz.
Creio que em toda família é possível encontrar vários tipos de pessoas. Há os rebeldes, os intelectuais, os engraçados, os mal-humorados, os tranqüilos, os agitados, os vegetarianos, os que ingerem bebida alcoólica e os que não o fazem, os que falam muito e os que preferem ser ouvintes, os que são exímios cantores e os extremamente desafinados, os politicamente engajados e os que estão “por fora”. Onde eu estava, havia vários exemplares de cada um destes tipos. E mesmo com toda a diferença, a harmonia prevaleceu.
Por mais amigos que tenhamos, por mais calorosos que sejam, penso que nada se compara à família. Podemos estar distante de algum parente, podemos até não concordamos com suas idéias e atitudes, mas o respeitaremos simplesmente por fazer parte da família e sabemos que, se um dia for preciso, ele nos estenderá a mão. Entre parentes costuma haver um laço invisível aos olhos, mas não ao coração.