
Trabalhando há 7 anos com adolescentes em conflito com a lei, considero verdadeira a afirmação acima.
A maioria das infrações cometidas entre os adolescentes da Fundação CASA vem do desejo de ter um tênis Nike, o game e o celular de última geração, o boné John John. Desejam o mesmo que um adolescente de classe média e/ou alta.
Na coluna posterior, Contardo diz: "(...)os bens que desejamos são indiferentes; o que importa é o reconhecimento que esperamos receber graças a eles." Fato. Os adolescentes (e também os adultos) medem seu valor por aquilo que têm, pois através do que ostentam almejam ser reconhecidos pela sociedade, ou seja, envaidecem-se através do olhar do outro (entre os adolescentes que cumprem medida socioeducativa de internação, há aqueles que pedem para a mãe trazer fotos do seu tênis ou de sua moto para mostrar para os colegas).
Na mesma coluna, Contardo afirma ""é provável que a cobiça e a vaidade cresçam com o "ter". Ou seja, é bem possível que a tentação do crime seja maior para quem tem mais do que para quem tem menos."" (vide os crimes de colarinho branco)
No entanto, encontramos tanto nas prisões como na Fundação CASA, uma grande maioria de sujeitos das classes menos favorecidas. Contardo atribui isso ao fato dos mais ricos terem melhores advogados. Considero meia verdade tal justificativa.
Um adolescente da classe A pode comprar o tênis do momento, viajar, ostentar roupas de grife etc.
E o o adolescente pobre? Ele também quer satisfazer seu desejo, quer ser notado, admirado. Crimes praticados em nome da ostentação são normalmente considerados torpes.
No entanto, imagine se de repente o adolescente de classe mais abastada não pudesse mais consumir seus objetos de desejo. Imagine se lhe fosse tirado o reconhecimento social.Podemos argumentar que o importante é o que somos, mas, infelizmente, na atual sociedade, somos o que temos.
Antes que alguém me condene, não estou justificando as infrações dos adolescentes e sim tentando compreendê-las. O filósofo Mário Cortella, no Saia Justa (GNT) frisou que justificar é tornar justo. Não, não acho justo um assalto, mas conhecer as contingências envolvidas, permite tratar o adolescente com humanidade.
No referido programa, Mário Cortella afirma ainda que somos livres para escolher. Mas nem sempre nossas escolhas resultam em ações (moral) que vão ao encontro de nossos princípios e valores (ética).
Os adolescentes infratores geralmente sabem que estão agindo contra lei, mas nem sempre consideram-se errados. A ética deles destoam, em parte, das normas socialmente aceitas.(tendo como norte a ética de organizações criminosas como PCC e CV, assaltam aqueles que julgam ricos, condenam o estupro e a delação - "caguetar", não cometem furtos ou roubos na comunidade, poupam crianças e idosos entre outras. Há deslizes que geralmente são punidos pelo próprio grupo - muitas vezes de forma violenta.) Curiosamente, na gíria destes adolescentes, seguir sua ética é "correr pelo certo".
Assim não podemos olhar para os nossos princípios e valores e simplesmente transferi-los estes adolescentes.( Lembrei-me de Betinho: "Se não vejo na criança uma criança, é porque alguém a violentou antes,
e o que vejo é o que sobrou de tudo que lhe foi tirado.")
Sou terminantemente contra a redução da maioridade penal. Latrocínios, homicídios? Penso que deve ser analisados caso a caso, mas de qualquer forma, considero que não deve ser encarcerado com os adultos.Pois é possível recuperar estes adolescentes. É preciso amor, acolhimento, comprometimento para sensibilizar o adolescente com relação a sua vítima. É preciso levá-lo a se dar conta da violência de seu ato. É preciso convencê-lo que o estudo pode garantir uma vida profissional que lhe possibilitará a satisfação de seu desejo; é preciso convencê-lo que o trabalho, mesmo rendendo bem menos que o tráfico de drogas, trará satisfação pessoal e social. É preciso levá-lo a vislumbrar um cotidiano em que não haja mais necessidade de correr da polícia, ainda que continue sendo revistado por causa de sua roupa e tatuagens. É preciso que ele encontre um ambiente que possa desenvolver habilidades, talento.
Os centros que executam as medidas socioeducativas tem muito a melhorar, mas vem gerando bons resultados. Há beleza naquele adolescente orgulhoso
de ter aprendido cozinhar ou fazer um rap que discorre sobre seus planos de deixar o crime ou vencer uma competição esportiva. Há beleza quando 542 internos da Fundação CASA estão no final da Olimpiada Brasileira de Matemática da Escola Pública (fato ocorrido em setembro de 2014). Há beleza quando abandonam a carcaça do crime e se revelam meninos. .
Os centros que executam as medidas socioeducativas tem muito a melhorar, mas vem gerando bons resultados. Há beleza naquele adolescente orgulhoso
de ter aprendido cozinhar ou fazer um rap que discorre sobre seus planos de deixar o crime ou vencer uma competição esportiva. Há beleza quando 542 internos da Fundação CASA estão no final da Olimpiada Brasileira de Matemática da Escola Pública (fato ocorrido em setembro de 2014). Há beleza quando abandonam a carcaça do crime e se revelam meninos. .