Mafalda


quarta-feira, julho 09, 2008

Eu vi os olhos da liberdade

Um dia achei que finalmente havia conhecido a sensação de ser livre: quando tinha 18 anos fui morar em São Paulo, deixei a casa dos meus pais. Mas precisei morar com minha tia e não senti o gostinho, por completo, do que eu supunha ser a liberdade. Enquanto ainda lá estava, viajei à São Carlos para prestigiar o Lual da Universidade Federal (UFSCar), tendo Arnaldo Antunes como maior atração. Fiquei deslumbrada: ali estava a liberdade que tanto almejava.
Não demorou muito para que eu deixasse São Paulo e voltasse para Barretos com o objetivo de estudar para passar no vestibular da UFSCar. E consegui. Agora era tudo como eu sonhara: eu morava numa república, era dona de mim! Eu era livre o suficiente para chegar em casa a hora que eu quisesse, para escolher minhas companhias e festas. Mas sem limite, acabei indo longe demais, demais a ponto de ferir a mim mesma e detestar a personagem que eu havia criado. Foi difícil perceber que a liberdade que vivi era ilusória: vi-me presa a uma imagem irreconhecível – havia um abismo entre o que o outro esperava de mim e o que eu desejava ser. Sofri demasiadamente para me reinventar. Fui crescendo...
Aos poucos, dei-me conta que para sentir-me livre não precisava estar longe de meus pais. E ficava maravilhada cada vez que eu notava que aquilo que existe de mais belo em mim aprendi com eles. Mas ainda sentia um vazio que foi preenchido quando comecei amar intensamente pela primeira vez. Senti o sopro da liberdade. E pensava que desta vez seria eterna. Não durou esta sensação, pois não tardou para que eu me prendesse a este amor e o aprisionasse junto a mim...
Apaixonei-me novamente e achei que desta vez seria diferente, pois me vi livre para descobrir a mim mesma. Só que mais uma vez, coloquei-me numa cela. Eu queria me encontrar através do outro, julguei ser isso possível. Eu achava que o outro pudesse me conceder a felicidade. Eu não estava livre: eu dependia dele e dei a ele a responsabilidade sobre minha vida. Foram dias conflitantes. Eu temia me achar comigo mesma. Mas eu não podia mais me enganar e me vi sozinha.
Felizmente, a vida nos reserva surpresas. Fui agraciada com a possibilidade de me realizar, de colocar em prática anos de estudo e experiências vividas. E é nesta situação que estou hoje. Sinto uma liberdade genuína e a descrevo como sendo aquela que somente eu posso me conceder e independe da apreciação alheia.
Eu vi os olhos e o sorriso da liberdade. E não foi em mim. Eu vi num outro. E era deste outro que eu gostaria de ter escrito. Mas eu nunca sei aonde vou chegar diante da tela em branco. Deixo-me levar. No entanto, não poderia deixar de mencionar aqueles olhos, pois, se eu não tivesse tido o privilégio de contemplá-los, estas linhas não existiriam.